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A tecnologia como aliada da vida cotidiana no autismo

abr 21, 2023

Em primeiro lugar, deve-se enfatizar que não existem duas pessoas autistas iguais, da mesma maneira que não há dois neurotípicos com as mesmas características; todos nós temos capacidades e pontos fracos diferentes. No entanto, é verdade que o Autismo geralmente apresenta dificuldades em comum: comportamentos repetitivos, particularidades na comunicação, frustração diante da imprevisibilidade do ambiente. Porém, atualmente, graças à tecnologia, podemos obter recursos que nos ajudem a viver a vida de uma forma mais confortável, agradável e, inclusive, prazerosa.

 

Desde a infância, os meninos e as meninas autistas sofrem bullying por serem diferentes, por não falarem como os outros – ou por não falarem tudo, segundo o nível de suporte de Autismo -, por terem meltdowns ou crises devido à sobrecarga sensorial. Nesse sentido, é compreensível que busquemos ferramentas tecnológicas e aplicativos para nos adaptar ao ambiente que nos cerca.

 

Apesar disso, devemos lembrar que o Autismo não é uma doença ou uma patologia, mas sim uma condição do neurodesenvolvimento, e que a ajuda externa que a tecnologia nos brinda deveria se orientar para melhorar nossa qualidade de vida, colocar limites, reforçar nossa autonomia, e nunca para “corrigir” imperfeições ou defeitos individuais, como se houvesse algo quebrado ou defeituoso em nós – o esforço de convivência deveria ser recíproco, e não apenas nosso -.

 

 

Aplicativos para aprimorar as habilidades básicas

 

Em geral, e se falamos de necessidades de suporte maiores, existem aplicativos para se comunicar de maneiras alternativas – através de ferramentas de eye tracking – por exemplo, incentivar o desenvolvimento da linguagem, estimular as capacidades de organização e a autonomia pessoal – sequenciando, passo a passo, diferentes atividades – ou trabalhar a psicomotricidade e a respiração – aprender a gerir a ansiedade, é, em muitos casos, fundamental para evitar crises.

 

As TICs também nos ajudam a encontrar espaços de lazer acessíveis e de entretenimento – sem necessidade de socializar presencialmente, com o estresse que isso pode levar uma pessoa autista – a trabalhar as emoções – tanto as próprias como as dos outros – e colocar cuidadores e autistas em contato por meio de pulseiras inteligentes e outras ferramentas tecnológicas, que notificarão os responsáveis em caso de crise.

 

Os aplicativos, em suma, são especialmente úteis para as pessoas autistas porque criam ambientes previsíveis, intuitivos e precisos, em detrimento da arbitrariedade das situações sociais; são personalizáveis para cada caso concreto; são atrativos, multissensoriais e estimulantes – e isso é realmente importante em autistas hipossensíveis, que necessitam de estímulos atrativos ao seu redor -, e são um instrumento ideal para continuar as sessões de terapia de casa, através de atividades realizáveis de forma autônoma.

 

 

Ferramentas tecnológicas para gestão de tarefas

 

Todo mundo conhece as limitações físicas de certos espaços – muitos dos quais, ainda hoje em dia, são impraticáveis para pessoas com dificuldades de mobilidade física -, mas existe um conceito mais desconhecido e que afeta principalmente as pessoas autistas: a acessibilidade cognitiva. São incontáveis os processos e os ambientes pensados exclusivamente por e para neurotípicos, e, apesar de nossa boa vontade, geralmente não nos encaixamos neles – o qual nos condena à exclusão social.

 

Para os autistas, pode chegar a ser muito complicado compreender como estão estruturados os diferentes espaços, assumir a documentação, agendar atividades, gerir o tempo que precisamos para considerar um projeto, entender quando devemos entregar uma tarefa – já que as indicações parecem ser sutis, implícitas -, enfrentar procedimentos burocráticos eternos e intermináveis, ou socializar incontáveis vezes em um dia para pedir informação, esclarecimento de dúvidas e normas explícitas. Todos esses exemplos se referem a barreiras cognitivas da vida cotidiana.

 

Nesses casos, a tecnologia também pode ser uma grande aliada. O desenho wayfinding, por exemplo, se propõe a melhorar a legibilidade do ambiente e a navegação pela cidade, através de mapas interativos, passeios temáticos, indicações fáceis e intuitivas para chegar a um destino concreto ou pictogramas de sinalização. O objetivo é claro: melhorar a acessibilidade cognitiva dos espaços, e nos aproximar de uma acessibilidade universal – apesar de ainda estarmos muito longe de que isto seja uma realidade.

 

Além disso, devido à disfunção executiva, muitos autistas têm problemas relacionados com planejamento, organização e gestão de tempo. Nesse âmbito, também existem aplicativos para agendar atividades e tarefas pendentes, para enviar lembretes a nós mesmos – através de melodias, por exemplo -, ou para nos ajudar a compreender o tempo de uma forma mais concreta e mensurável – com temporizadores visuais, por exemplo, ou com timbres e sons programáveis.

 

 

Diagnóstico, ativismo e comunidades autistas

 

Por último, devemos falar das oportunidades que a tecnologia nos deu no momento de nos conectar remotamente às formações ou reuniões de trabalho – o teletrabalho, para pessoas autistas, pode ser muito mais confortável e agradável -, de acessar informações e investigações que, de outra maneira, nunca teríamos conhecido, ou de conhecer outras pessoas semelhantes a nós através das redes sociais.

 

Graças a essa conexão em rede, motivada pelos avanços tecnológicos, muitas mulheres – as quais têm um subdiagnóstico preocupante – estão se vendo reconhecidas em vídeos e canais de divulgação de ativistas autistas, e estão iniciando os procedimentos para receber seu próprio diagnóstico. Sem essa democratização da informação, muitas delas continuariam pensando que estão “quebradas”, que não se encaixam no sistema, que não existe nada no mundo como elas. E, graças ao diagnóstico, podem começar a reconstruir sua autoestima e melhorar sua qualidade de vida.

 

Além disso, as redes sociais nos permitem conhecer outros autistas, criar grupos de WhatsApp ou Telegram com colegas que pensam como nós, fazer ativismo para transmitir ao mundo nossos desejos e necessidades, e, em definitivo, criar e/ou encontrar comunidades de outras pessoas no espectro com inquietudes semelhantes e com as que podemos ser nós mesmos plenamente.

 

Artigo escrito por Montse Bizarro para o blog ThinkBig da Área de Sustentabilidade da Telefónica: https://blogthinkbig.com/tecnologia-autismo